24 de fev. de 2009

Confidências de um álbum de família


O domingo não podia ser melhor! As quatro irmãs e a mãe se reuniram como há muito tempo não faziam, quando a grande idéia foi recebida com euforia e diversão: - vamos ver os álbuns de fotografias?

Além de uma reunião familiar, esse era também um encontro de gerações. A matriarca estava para completar seus 78 anos, sua primogênita tinha 46; seguida por outra de 43; a terceira de 40 e a caçula – temporã – como a família a definia, tinha 32 anos. A trilha sonora desse encontro não podia ser outra, o lançamento de Amado Batista era embalado no novíssimo aparelho de DVD da irmã mais velha. A caçula era a única que não se identificava com o estilo musical das demais, mas adorava viver esses nostálgicos momentos em família que lembravam sua infância na década de 80.

O primeiro álbum a ser aberto gerou muita expectativa e grandes risadas – o casamento da irmã mais velha – ocorrido há 30 anos, exatamente em 1979, quando ela tinha apenas 17. O primeiro fato a despertar a atenção foi o vestido de uma das madrinhas de civil que era simplesmente igual ao da noiva e o pior de tudo, na hora da foto elas ainda ficaram uma ao lado da outra. Meu Deus! Que falta fazia naquela época uma assessoria cerimonial pra resolver esses pequenos detalhes responsáveis por dez longos anos de terapia.

Analisando minuciosamente cada foto, a irmã caçula estranhou a igreja estar vazia, com pouquíssimos convidados. A típica família mineira, que nessa época se aventurava por terras paulistas, era conhecida por ser numerosa, com uma média de oito filhos por casal, o que representava uma infinidade de tios e primos. A explicação é de causar arrepios até aos mais antiquados e preconceituosos dos seres atuais: - Ah! As pessoas fugiam de casamento de quem fugiu. Era um escândalo pra época!

Os motivos pelos quais os casais fugiam também não foram entendidos pela irmã caçula. Parece que era pra justificar uma possível gravidez e por conseqüência, pra justificar o sexo. Então o que os jovens casais queriam mesmo era ter uma vida sexual ativa, mas isso só era possível se casassem e o casamento só era possível se fugissem e aí quando fugiam, casavam. Os parentes não compareciam, os vizinhos fofocavam, os pais entravam na igreja com a cabeça baixa, a noiva quase não sorria e o noivo parecia assustado. E assim se dava o início de uma vida a dois!

Um a um, os álbuns foram abertos e trazendo à atualidade histórias lindas, emocionantes, saudosas, tristes, festivas. As fotografias eternizaram vidas inteiras e evidenciaram o natural ciclo da vida, com a chegada das crianças a esse mundo, os batizados, os aniversários, as festinhas de escola, as medalhas e até os casamentos de quem parece que tinha acabado de nascer.

As lentes flagraram momentos únicos, brincadeiras de quem quase nunca brincava, danças excêntricas, caretas de quem corria das fotos, risadas gostosas, olhares distantes e infinitos. Foram registradas as festas de famílias, as visitas de amigos e parentes distantes, as viagens, os novos lugares e as pessoas conhecidas aleatoriamente e que nunca mais serão vistas.

As fotos denunciaram pessoas mais magras, gente mais gorda, casais que se beijavam, outros que brigavam, casamentos desfeitos, espinhas no rosto, roupas que hoje são fora de moda, cabelos esquisitos e nariz original. Teve foto escondida que reapareceu, foto rasgada e descartada. Teve gente que assumiu ser o autor daquele flagrante, gente que implorou pra ganhar uma fotografia do passado e gente que praguejou quando viu que aquela foto, daquela pessoa, ainda existia naquele baú.

O mais prazeroso de tudo isso foi saber que nas fotografias as pessoas não nos deixam, elas não partem, são eternizadas e permanecem vivas. Nas fotos, pai e mãe nunca morrem, pessoas queridas não adoecem, filho não cresce, criança não perde a inocência, gente não envelhece, momentos não se perdem e a vida nunca acaba.

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