31 de jan. de 2009

Querendo ficar só


Após um dia daqueles de trabalho, ela desejou uma deliciosa massa, acompanhada de um bom vinho e de uma companhia agradável, sua própria!

E é isso que fez, passou naquele supermercado de sempre, que tem comida pronta e quentinha, escolheu um talharim com molho vermelho e uma composição bem peculiar, azeitona preta, tomate seco, champignon e uma pitada de bacon crocante, delícia!

Hora de escolher o vinho. Ela nunca foi muito boa nisso, sempre gostou mais de degustar do que de comprar, mas enfim, é o que tem pra hoje. Pesquisou as marcas mais conhecidas, tinha os suaves, doces, secos, tintos, brancos e rosés, espumantes, aromáticos, era muita opção... Queria um frisante, mas como não encontrou escolheu um tinto, suave, que provavelmente iria cair muito bem com o friozinho gostoso do outono daquela noite.

Seguiu ansiosa pro apartamento, querendo ficar quietinha, tranqüila, sozinha, e provar o delicioso macarrão com vinho, em sua própria companhia! Primeiro o banho e o aconchegante ritual de se arrumar pra ela mesma.

É chegado o grande momento, já estava na cozinha devidamente preparada, o talharim quentinho, muito bem disposto no prato, quando pegou o vinho e um objeto estranho chamado saca-rolhas para a primeira experiência de sua vida no ato de abrir uma garrafa de vinho.

Desde criança, quando via um saca-rolhas guardado no armário, ela sempre soube qual era a sua função. Quando participava daqueles encontros chatos de mulheres que iam se casar, em pleno sábado ou domingo à tarde, o chá-de-panela ou chá-de-cozinha, também acreditava que esse instrumento tinha lá a sua utilidade. Mas na verdade, ela nunca tinha experimentado a sua verdadeira eficiência. Até que nesse dia, seu teste de qualidade reprovou o tal objeto.

Ela segurava a garrafa com a mão direita e o saca-rolhas com a mão esquerda e ia girando-o, girando-o, e nada de abrir. Enfiava a garrafa embaixo do braço e mexia o tirador de rolha, e nada. A garrafa agora estava na mão esquerda e o saca-rolhas, na direita, e nada. Repetia a primeira posição e nenhum resultado satisfatório.

No desespero, algumas alternativas começaram a surgir, entre elas, bater no apartamento da vizinha e pedir para que seu marido fizesse esse favor, mas pensou bem e concluiu que não seria uma boa iniciativa. Pensou até em pedir para o porteiro do prédio, mas ele vivia paquerando a jovem moça que morava sozinha, então achou que talvez com essa atitude poderia alimentar alguma falsa esperança no coitado.

Após muitas tentativas frustradas e idéias não tão criativas, foi obrigada a comer seu talharim esquentado no microondas, acompanhado de suco de uva, que por sorte vinha naquelas embalagens tetra pak e tinha sobrado da semana anterior. Enquanto olhava para ele à sua frente, inteiro, intacto, encorpado, fazendo-se de difícil só para irritá-la.

Nessa hora ela percebeu que sua própria companhia nem sempre supri todas as necessidades...

Ela foi para a cama e o vinho para a geladeira.

5 comentários:

.Juliana Andrade. disse...

haha.. que óóótimo esse texto! Uma pitada de sarcasmo.. coisa linda viu! Adoro.
Beijos Sandríssima.
Saudade

Amanda disse...

Para mim este texto é campeão...é rir pra não chorar, fiquei com tanta pena dela...
É arrumar uma boa companhia ou aprender a usar o saca-rolhas.

Sandra Alves disse...

Amanda, mas o pior de tudo é que nesse dia ela não queria outra companhia senão sua própria.

Tadinha! Teve um dia daqueles, muitos problemas no trabalho, inúmeros compromissos pra administrar. Ela simplesmente desejava apreciar uma boa comida, um bom vinho e relaxar, mas infelizmente, o saca-rolhas a sacaneou...

Particularmente, acho que as duas opções são importantíssimas: uma boa companhia e aprender a usar o saca-rolhas!

.Juliana Andrade. disse...

Sannnnnndra... já leu um texto do L. F. Veríssimo.. que fala da princesa... que comeu as perninhas da rã? rsrs Lembrei dele relendo o seu rs
Muito bons.. ambos!
Beijos
.ju.

Sandra Alves disse...

Ju!!!!!!!!!!
Acabei de ler o texto da princesa e da rã.
Tem um humor contemporâneo né, bem interessante...
Grande beijo